2.4.11

daqui a pouco

depois quando não existe
depois
não existe
só o agora continua insistente
se fosse um homem ou mulher de olhos grandes
o agora telefonaria muitas vezes
até que alguém atendesse
pra que a gente se gostasse no primeiro instante
e vivesse dias inteiros estragados por detalhes
aparelhos com defeito, despencamento de cabides
um amigo inconveniente, o gênero errado de filme
alergia a pólen
alergia a cabelos

23.3.11

poltrona 29

os tapetes diante de portas
nunca por você visitadas
estendendo as franjas
em convite

há quem comente
que bonito é conhecer
o mundo em quantidade
visitar países distantes
passar por aqui antes

há quem acredite
que não há pra onde
levar pra longe

as bolsas de pele
embaixo dos olhos de
quem você não conhece

3.3.11

mau sinal no subsolo

mau sinal se aqui não chega
o calor que você dizia
enviar só pra mim
o roteador não tem nada
a dizer sobre os planos
largos acima dos cabos
ninguém pra arrombar as portas
trancadas dos carros
e destruir os anexos
que você dizia manter
só pra mim

6.2.11

os anéis vão enfileirados

eles esticam os braços pra medir a distância
são disciplinados
na tarefa de abandonar os dedos
no banho ou de madrugada

21.1.11

chuva nos sapatos

baixos
se a chuva cai direto
e de propósito dentro dos sapatos
é preciso lembrar que toda poça
contém outros líquidos e restos
apenas bem-vindos quando emitidos
por outros ratos
cachorros
criminosos
e mendigos


altos
a chuva dificulta
a semana que só íamos levando
como copo d'água da cozinha pro quarto
e do quarto pra cozinha
te peço que não leve pro banheiro
apenas pro interior do seu corpo
onde percorrerá vísceras que não percorro
monstro do lago e do pântano
a chuva interromperá de novo nosso único plano
mas cronometrará com cuidado o intervalo
entre você aí nos trilhos
e eu aqui aos solavancos

3.12.10

gostar dos outros

1.
moedas pro leite caro do filho que não temos
canetas-calendário que apenas se imaginam perfumadas
acompanhadas de um folheto sobre o perigo das drogas
gostar dos outros é cambalear pelo ônibus
vendendo a marca de chiclete que ninguém gosta

2.
gostar dos outros é ir a uma festa americana
levando salgados numa vasilha amarelada
uma vasilha com tampa que não encaixa
torcendo pra que você coma
eu só trouxe pra você
os meus salgados

11.11.10

ingresso pro lugar certo

depois de chegar enfim
ao lugar certo
carregar malas e ganhar
calos nas mãos

você deixa que a música
acabe e perde os motivos
pra planejar o futuro

existe cartão de crédito pra tudo
no lugar certo
você não precisa mais se preocupar
em chegar a outro

o lugar certo
é como um seriado de TV cancelado
e você pensa ser o único ator
que vai fazer sucesso depois

29.9.10

bolsa pesada de carteiro

um carteiro pra chamar
de seu
entre outros nomes
exceto o dele
se a carta não chegar
nem depois de meses
de torcida dos parentes
um carteiro pra colocar a culpa
sem remorso em caso de acidente
o carteiro não levará mágoa nenhuma
só cartas
em sua bicicleta
porque mágoa seria peso extra
e peso extra todo carteiro evita
todo bom carteiro nunca abre ou espia
nem por um minuto a correspondência
dessa rua
ou da sua

13.9.10

calor no inverno

até calafrios de febre
podem substituir ventiladores
quando faz calor em pleno inverno
e alguém esquece de puxar os fios
do frio

a cidade e todos que conhecemos
não andam se entendendo
nós, ao contrário da cidade,
quase sempre lavamos sozinhos
e com capricho
os cabelos

6.9.10

madeira e alvenaria

pelas frestas
ferrugens e finais

olhar bem um canto do assoalho
gritar na varanda

uma vida inteira
pra tentar descobrir
onde começam

a reforma e a pintura
das casas velhas que são
quem a gente quer bem

5.9.10

quem empresta

os livros preferidos nas edições exatas
as mesmas orelhas nas mesmas páginas
um autor citado nas conversas
em que se tenta mostrar conteúdo
agora nas mãos ásperas e sem escrúpulos de quem empresta
logo os filmes que você mais gosta
com o ator que lembra um irmão ou amigo
um personagem que se parece com você dez anos antes
e agora dez anos depois não queria entregar de mão beijada
pro interior das bolsas manchadas de quem nunca devolve
os melhores e mais doloridos discos da sua vida
de preferência com uma história parecida
pra contar em mesas de diferentes cidades
onde os presentes serão estranhamente próximos
aos da outra cidade e ao dono da primeira estante
de repente quem devolve logo tenta te encontrar
de novo ou, pelo contrário, quem não sente nada
é que devolve antes

1.9.10

o amaciante mais barato do mercado

a máquina de lavar
modelo tanquinho
destrói semanalmente
os tecidos íntimos

10.8.10

triângulo das bermudas

na enchente quem salvará
nossos grampos
clipes e alfinetes

o resgate não virá
para ramonas
pregos e pentes

um carro desgovernado
esfregará ex-bermudas
pelo chão e paredes

23.7.10

diabetes de tamires

nossa sala enfileirada
na quadra

pirulitos entregues
pelas professoras

lanço olhares cúmplices mas esqueço
que tamires não enxerga
tamires não faz nada direito

só abre agora o pacote de amendoim
salgado que só ela
só ela ganhou

22.7.10

no rio de janeiro


peso pena terá lançamento carioca no dia 24,
no sebo baratos da ribeiro.

mais informações no http://pesopena.wordpress.com/